segunda-feira, 25 de abril de 2011

Curinga

“Vivemos nossas vidas num incrível mundo de aventuras, pensei. Apesar disso, a grande maioria das pessoas considera tudo isso “normal”. Em compensação, vivem em busca de algo fora do normal: anjos ou então marcianos. E isso se explica pelo simples fato de que elas não consideram um enigma o mundo em que vivem. Para mim a coisa era completamente diferente. Para mim, o mundo era um sonho muito estranho, e eu vivia em busca de uma explicação racional qualquer para esse sonho. E enquanto fiquei parado ali, observando o céu ir mudando de cor, primeiro cada vez mais vermelho e depois cada vez mais claro, experimentei uma coisa que jamais havia experimentado antes; um sentimento que desde então nunca me deixou: lá estava eu na frente da janela da cabine de um navio, eu, um ser enigmático, vivo, mais que apesar disso nada sabia de si. Experimentei a sensação de ser uma criatura viva num planeta vivo dentro da Via Láctea. Talvez já tivesse consciência disso antes, pois esse era um tema que já tinha sido abordado várias vezes dentro da educação que eu vinha recebendo. Mas aquela era a primeira vez que eu sentia aquilo tudo por mim mesmo. E aquele sentimento se instalou em cada célula do meu corpo.”


O Dia do Curinga, Jostein Gaarder – pág. 164

A vida é preciosa

“(...)Quando ele começava assim, eu já sabia que ia ter de ouvir uma longa explanação.


- Você tem consciência de que naquela época você tinha muitos milhares de antepassados? – perguntou meu pai.

Balancei a cabeça em sinal de dúvida sobre o que ele havia dito. Como aquilo podia ser possível?

- Todos nós temos um pai e uma mãe, quatro avós, oito bisavós, dezesseis tataravós, e assim por diante. Se você for fazendo as contas até voltar a 1349, vai chegar a um número bem grande.

Concordei.

- Então veio a peste. A morte rondava os povoados, um a um, e as crianças eram as suas maiores vítimas. Em algumas famílias morreram todas as crianças; em outras, uma ou talvez duas conseguiram sobreviver. Naquela época, Hans-Thomas, muitas centenas dos seus antepassados eram crianças. E nenhum deles morreu.

- Como é que você pode ter tanta certeza disso? – perguntei intrigado.

Ele deu uma tragada no cigarro um continuou:

- Porque você está bem aqui ao meu lado, olhando para o mar Adriático.

Essa foi mais uma daquelas conclusões surpreendentes, que me deixavam sem saber como reagir. Uma coisa era certa: meu pai tinha razão, pois se apenas um de meus antepassados tivesse morrido quando criança, ele ou ela não poderia ter sido meu antepassado.

- A probabilidade de nenhum de seus antepassados ter morrido ainda criança era uma para muitos bilhões – prosseguiu ele. E a partir daí suas palavras começaram a jorrar como a água de um dique que se rompe: - Pois não estamos falando aqui apenas de uma peste, entende? Todos, todos os seus antepassados cresceram e tiveram filhos em épocas que foram palco de mais terríveis catástrofes naturais e que, além do mais, possuíam índices assustadores de mortalidade infantil. É claro que muitos deles chegaram a ficar doentes, mas o fato é que todos sempre sobrevivem às enfermidades. Assim, por muitas centenas de bilhões de vezes você esteve a um milímetro da morte, Hans-Thomas. Sua vida nesse planeta foi ameaçada por insetos e animais selvagens, meteoros e raios, doenças e guerras, enchentes e incêndios, envenenamentos e tentativas de assassinato. Só na guerra dos Trinta Anos você deve ter se ferido muitas centenas de vezes, pois você deve ter tido antepassados de ambos os lados. Sim, no fundo, você travou uma guerra contra si mesmo e contra suas possibilidades de nascer três séculos mais tarde. E o mesmo vale para a Segunda Guerra Mundial: se algum bom norueguês tivesse abatido o seu avô durante o período da ocupação, nem você e nem eu teríamos nascido. Estou falando de uma coisa que aconteceu muitos bilhões de vezes ao longo da história. Todas ás vezes em que uma seta cortou os ares sibilando, as chances de você nascer foram reduzidas a um mínimo. Mas aí está você, Hans-Thomas, sentado bem ao meu lado e conversando comigo. Entende? (...)”

O Dia do Curinga, Jostein Gaarder – pág. 140

Maravilhar-se é necessário

Pergunto-me: estou preparada para morrer? Minha resposta é não.


Do nada vem na minha mente a idéia de que um dia irei morrer e toda a história que estou escrevendo nesse mundo terá um ponto final.

Nós não nos preparamos para a única certeza que nós temos na vida: de que um dia morreremos.

Muitos se esquecem de viver intensamente porque se esquecem desse detalhe.

Às vezes não sabemos como agir, trabalhamos a vida toda, perdemos nossa saúde para depois ficarmos velhos, olhar para trás e vermos quer não vivemos como gostaríamos.

Há pessoas com os dias contados (com doenças terminais por exemplo) que aproveitam seus últimos momentos em vida e fazem o que realmente gostam, porque sabem que vão morrer, vivendo intensamente, porém todos deviam fazer isso, pois todos nós estamos à beira da morte, não sabemos quando iremos morrer, se vai ser daqui 50 anos, 1 mês ou até mesmo no próximo minuto.

Mas o mundo não é só feito de vontades, ele é como uma fábrica, a fábrica da Vida e cada um tem sua função para que ela funcione, por isso existe as obrigações, porém fazer o que gostamos é necessários para que nossos deveres se tornem harmônicos. Também devemos tomar cuidado para nossa vida não se tornar uma rotina completa, digo completa porque a rotina de certo modo nos ajuda a organizar o que fazemos no dia, mas deixar que tudo vire rotina é perigoso.

Viver é sentir sua existência, poder maravilhar-se com o mundo magnífico que vivemos e não apenas existir, vendo o mundo sob olhos e lentes preto e branca, como se a nossa existência fosse lógica, normal, óbvia...

 
A vida e a filosofia


Passamos a viver bem quando a vida começa a responder nossas perguntas, acalmando nossas incertezas, mesmo que elas sempre existam.

Esse é o mundo do mistério e isso nos motiva a sentir o quão magnífico é o mundo, que ao mesmo tempo possui uma lógica de existência que quando pensamos bem ela some, como se nunca tivesse existido.

Viver bem é maravilhar-se com as singularidades, com os detalhes da vida, que a rotina embaça nossos olhos de ver. Maravilhar-se é filosofar e filosofar é sentir com a lógica da mente e pensar com o coração, equilibrando pensamento e sentimento.